Academia Flamenga de Letras, a mais rubro-negra das instituições literárias

Academia Flamenga de Letras

Marcelo Dunlop fala sobre a mais rubro-negra das instituições literárias

Era terça-feira, dia 11 de maio de 2021, quando o telefone do jornalista e escritor Marcelo Dunlop tocou. 

Do outro lado, ninguém menos que Arthur “Urublog” Muhlenberg, PhD em rubro-negrismo e literário com grandes préstimos à Nação. E quando dois rubro-negros desse naipe se juntam, a sensação é a mesma de quando o Arrasca pega na bola: vai sair coisa boa.

Não deu outra. Muhlenberg compartilhou com Dunlop a ideia de lançar um “panteão dos imortais rubro-negros, uma Academia com os maiores gênios, brasileiros ou não, que vestiram rubro-negro e eram Flamengo para chuchu”. E assim nasceu a Academia Flamenga de Letras (AFL), a mais rubro-negra das instituições literárias.

Fundada em 15 de novembro de 2021, a Academia Flamenga de Letras reverencia a influência do Flamengo na cultura brasileira

Para saber mais sobre a AFL, a Estante Rubro-Negra procurou Marcelo Dunlop, autor do ótimo “Crônicas flamengas”. Esbanjando bom humor, irreverência e conhecimento sobre o universo cultural do Mais Querido, ele deu mais detalhes sobre a iniciativa.

Entrevista

Marcelo Dunlop

(ERN) Como surgiu a ideia da AFL?

(MD) Cara, era uma terça-feira, dia 11, sempre tenso – não à toa é o dia da semana em que as Torres caíram lá em NY. Tocou o meu telefone e era o Arthur Muhlenberg, mas mesmo assim eu atendi.

Ele lançou a ideia de um panteão dos imortais rubro-negros, uma Academia com os maiores gênios brasileiros ou não que vestiram rubro-negro e eram Flamengo para chuchu. Abracei a proposta na hora e começamos a falar os nomes mais óbvios, Zé Lins, Ary Barroso, Carmen Miranda. 

Depois fui saber que o Arthur alimentava essa iniciativa há um bom tempo, coisa de uns 20 anos. Parece que, na confraria Fla-Bujica, o pessoal debatia isso o tempo todo. Quem merecia entrar, quem merecia estátua, quem merecia busto e quem ganharia um “valeu” no papel de pão, e olhe lá. “O debate por lá jamais foi conclusivo e segue em aberto”, garante o Muhlenberg. 

No caso, parece que lá o panteão incluía jogadores, então terminava em cadeira voando, porque ninguém se entendia sobre Romário, sobre esse ou aquele. Restringimos aos nobres escribas e talvez estejamos perto desse ponto final. 

Mas tudo começou ali naquele contato via Embratel, ou via Whatss, um telefonema Brasília-Teresópolis, em maio de 2021.

A rubro-negra Carmen Miranda

A AFL tem patronos da antiga, como Carmem Miranda…

(ERN) Os 40 patronos escolhidos não formam um time, mas uma seleção. Qual vai ser o critério de escolha dos imortais? Vi que já há alguns indicados…

(MD) O que me fez abraçar o projeto com tanto élan e curiosidade foi meu interesse de anos sobre o tema. Eu já tinha escrito uma vez que é uma contradição chamarem o Flamengo de time de analfabetos se um dos escritores mais amados do Brasil, de estilo sem igual, era um rubro-negro de sujar as calças nas arquibancadas. Refiro-me ao Rubem Braga. Mas podia falar o mesmo de José Lins do Rego. E outros.

O critério é ser bamba e ser flamengo. Mas tem que ser os dois. O Caetano Veloso por exemplo já se declarou rubro-negro, assim como o Cazuza. Mas não entraram, tinha gênio da música mais fanático. 

A Elza Soares, por exemplo, é a acadêmica típica. Monstra sagrada, flamenga tarada. Que ela nos abençoe, acabou partindo sem ver seu nome na academia. Ela já estava entre os 40 imortais, claro. A derrota no Uruguai baixou nosso facho, precisamos voltar aos debates. Normalmente puxo 40 nomes, mostro ao Arthur, envio a lista por email ao Ruy Castro, chamo outros amigos para ver, e o debate come. 

Por enquanto, minha lista de imortais seria esta, de A a Z, mais ou menos: Alcione; Arlindo Cruz; Arnaldo Branco (na cadeira do Henfil); Arthur Muhlenberg; Bebeto (o cantor, o cantor!); Bráulio Tavares; Claudio Cruz da Raça; Eduardo Monsanto (na cadeira Jorge Curi); Elza Soares; Fernando Calazans; Jânio de Freitas; João Bosco; Jorge Benjor; José Padilha (na cadeira do Carlinhos Niemeyer); Mário Magalhães; Milton Hatoum; Moacyr Luz; Nana Caymmi; PC Pinheiro; Roberto Assaf; Ruy Castro; Sandra de Sá; e Ziraldo.

Ainda tem espaço para muito cobrão, como se vê. Mas ainda tenho que ouvir meu conselho de notáveis.

(ERN) Fora os 40 imortais, como vai ser possível para os mortais participarem da AFL? Há alguma forma de contribuir e participar da iniciativa?

(MD) Por enquanto, a melhor maneira é comentar na página original, lá no República Paz & Amor. Ou mandar mensagem pro Arthur no Twitter

Mas ainda queremos fazer uma grande farra presencial. Antes de 2030 isso sai, pode anotar aí. Vamos dar uma acelerada nisso e soltar os 40 nomes em fevereiro, se o carnaval – ou a falta dele – não atrapalhar.

(ERN) Pela escolha dos patronos, a AFL preza pela ligação com o povo, certo? Ao contrário da ABL, que parece manter um certo distanciamento do que é popular, a proposta da AFL é ser exatamente o oposto – ou seja, fomentar a raiz popular que é tão inerente à alma flamenga?

(MD) O Flamengo é a instituição mais competente na arte de unir e congraçar gente do povão com gente biliardária e até gente metida a besta, tudo no mesmo degrau de arquiba. 

Nem as religiões conseguem fazer isso tão bem. As escolas de samba talvez. Popular ou erudito, para estar na AFL basta ao craque das letras ser capaz de inspirar a massa.

(ERN) O que foi mais difícil na hora de fazer a lista dos patronos, todos já falecidos?

(MD) Na hora do tal telefonema, nós ainda tínhamos dúvidas se havia 40 nomes acima de qualquer suspeita entre os antigos. Poucas semanas depois, a lista já passava de 60 e muita gente boa ficou fora.

Por exemplo, só de sambistas a gente levantou os nomes de Almir Guineto, Assis Brasil, Ataulfo Alves, Bezerra da Silva, Geraldo Pereira, João Nogueira, Mussum, Silas de Oliveira e, claro, Wilson Batista. Tudo flamengo tarado. Ficamos com o genial Candeia representando essa galera toda. 

Os escritores nordestinos também eram uma leva e tanto, como Homero Homem.

Mas creio que equilibramos bem, com alguns caras bem da antiga e outros amados pelos torcedores de hoje.

(ERN) Quais são os próximos passos para a AFL “sair do papel”?

(MD) O ideal era termos um local de reunião. Isso deve sair, assim que o povo do República Paz & Amor ganhar na loteria. Mas, como dizia o grande Monarco (fã do América, por sinal), é bom acertar a quina e a sena, que o negócio não está fácil para ninguém.

Foto do jornalista rubro-negro Victorino Chermont

… e contemporâneos, como o saudoso Victorino Chermont

Uma vez Flamengo, Flamengo até imortal: saiba mais sobre a Academia Flamenga de Letras 

A Academia Flamenga de Letras tem como “objetivo primeiro, educar“. E comprovar, histórica e literariamente, que a massa rubro-negra constitui maioria em toda e qualquer fatia da nossa população, dos iletrados mais sabidos ao intelectuais mais abestados”.

Assim como a Academia Brasileira de Letras, a AFL será composta por 40 representantes da Magnética que tenham contribuído para levar a cultura do clube para outro patamar.  Cada uma das cadeiras da AFL tem um patrono, gente que fez história não só pelo bom gosto para escolher time, mas pela relevância da obra. São eles:

  • Cadeira nº 1: Ary Barroso (1903–1964)
  • Cadeira nº 2: Almir Guineto (1946–2017)
  • Cadeira nº 3: Alvaro Moreyra (1888–1964)
  • Cadeira nº 4: Antonio Callado (1917–1997)
  • Cadeira nº 5: Antônio Candeia Filho (1935–1978)
  • Cadeira nº 6: Bussunda (1962–2006)
  • Cadeira nº 7: Carlinhos Niemeyer (1920–1999)
  • Cadeira nº 8: Carmen Miranda (1909–1955)
  • Cadeira nº 9: Celso Garcia (1929–2008)
  • Cadeira nº 10: Cyro Monteiro (1913–1973)
  • Cadeira nº 11: Dias Gomes (1922–1999)
  • Cadeira nº 12: Dolores Duran (1930–1959)
  • Cadeira nº 13: Dorival Caymmi (1914–2008)
  • Cadeira nº 14: Edigar de Alencar (1901–1993)
  • Cadeira nº 15: Edilberto Coutinho (1933–1995)
  • Cadeira nº 16: Geraldo Pereira (1918–1955)
  • Cadeira nº 17: Gilka Machado (1893–1980)
  • Cadeira nº 18: Heitor Villa-Lobos (1887–1959)
  • Cadeira nº 19: Henfil (1944–1988)
  • Cadeira nº 20: Jackson do Pandeiro (1919–1982)
  • Cadeira nº 21: João do Rio (1881–1921)
  • Cadeira nº 22: João Nogueira (1941–2000)
  • Cadeira nº 23: Jorge Curi (1920–1985)
  • Cadeira nº 24: José Lins do Rego (1901–1957)
  • Cadeira nº 25: José Maria Scassa (1911–1980)
  • Cadeira nº 26: Lan (1925–2020)
  • Cadeira nº 27: Manuel Bandeira (1886–1968)
  • Cadeira nº 28: Marcos de Castro (1934–2018)
  • Cadeira nº 29: Marilene Dabus (1939–2020)
  • Cadeira nº 30: Mario Filho (1908–1966)
  • Cadeira nº 31: Moraes Moreira (1947–2020)
  • Cadeira nº 32: Oscar Niemeyer (1907–2012)
  • Cadeira nº 33: Otelo Caçador (1925–2006)
  • Cadeira nº 34: Paulo Magalhães (1900–1972)
  • Cadeira nº 35: Péricles Maranhão (1924–1961)
  • Cadeira nº 36: Rubem Braga (1913–1990)
  • Cadeira nº 37: Rubens Gerchman (1942–2008)
  • Cadeira nº 38: Victorino Chermont (1973–2016)
  • Cadeira nº 39: Wilson Baptista (1913–1968)
  • Cadeira nº 40: Zózimo (1941–1997)

Os aspirantes a imortais rubro-negros precisam cumprir pré-requisitos como “amar o Flamengo, saber usar vírgulas e ter obras, em qualquer gênero da literatura escrita, falada, cantada ou assobiada, de mérito reconhecido pelos torcedores”.

Nada mais justo, já que a pessoa tem que estar, minimamente, à altura dos patronos para não dar aquela destoada que a gente percebe quando o Filipe Luís dá lugar ao Renê…

Para saber todos os detalhes sobre a Academia Flamenga de Letras, seus patronos e alguns dos indicados, confira este post da República Paz & Amor.

Crédito das imagens: Ary Barroso/Reprodução “O Globo” | José Lins do Rego/Reprodução Internet | Marilene Dabus/Divulgação “Approachh Editora” | Celso Garcia/Reprodução site Kleber Leite | Mario Filho / Reprodução Internet | Marcelo Dunlop / Reprodução Internet | Carmen Miranda / Reprodução “O Povo” | Victorino Chermont / Reprodução Internet